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Tradução do Workers Vanguard n. 1089 (6 de maio de 2016)

 

A frente popular do PT pavimentou o caminho para a reação da direita

Os operários não têm lado no impeachment do Brasil

Romper com o PT! Por um partido operário revolucionário!

Com um escândalo de corrupção sacudindo o país, a câmara baixa do congresso brasileiro votou, no mês passado, pelo início de um processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff. Desde 2002, o Partido dos Trabalhadores, inicialmente sob seu fundador, Luiz Inácio Lula da Silva, e depois sob Dilma Rousseff, governou o Brasil através de uma série de coligações de colaboração de classes. Hoje acusa-se Dilma Rousseff de alterar a contabilidade para disfarçar rombos no orçamento federal. Os antigos sócios de coligação do PT –eles próprios investigados ou enfrentando processos por corrupção em muitos casos– são parte daqueles que lideram o ataque contra Rousseff. Um deles é o vice-presidente Michel Temer, do burguês PMDB, que assumirá a presidência se Dilma Rousseff for suspensa ou destituída do cargo.

O bloco que governa o Brasil é um exemplo de “frente popular”, uma coligação de colaboração de classes onde um ou vários partidos operários aliam-se com forças burguesas para governar em nome dos capitalistas. Nós, por princípio, somos contra essas formações burguesas. Os partidos operários reformistas, como o PT, têm uma contradição de classe entre a base proletária e o programa pró-capitalista de sua direção. Quando esses partidos, não obstante, entram em uma aliança frente populistas, a contradição de classe é suprimida em favor da burguesia, garantindo que não serão ultrapassados os limites daquilo que a classe dominante considera aceitável enquanto esses partidos estiverem no poder. Mais uma vez, isso foi confirmado pela experiência de governo do PT.

Durante mais de cinco anos, o governo de Rousseff impôs à classe trabalhadora toda uma ladainha de ataques, desde a implementação de medidas de austeridade e cortes no gasto social até ataques contra operários em greve e camponeses que resistem contra o despojo de suas terras. Esses ataques se seguiram a quase uma década de duros rigores impostos pelo FMI durante o governo do antigo líder operário Lula, que, como presidente, mostrou ser um servidor confiável tanto dos imperialistas como da burguesia brasileira. O PT de Lula usou a sua autoridade sobre o movimento operário para implementar medidas neoliberais que nem os seus predecessores de direita tinham conseguido implementar. Ao mesmo tempo, a primeira época do governo PT coincidiu com um auge global nos preços das matérias-primas, sendo que o Brasil é um dos principais exportadores. O PT conseguiu dividir algumas migalhas como pagamentos em dinheiro para os pobres (Bolsa Família) e aumentos no salário mínimo.

Mas esse auge acabou. Durante os dois últimos anos, o Brasil sofreu a pior queda econômica em décadas. Além da campanha pró-impeachment, tanto os aliados de Rousseff como os inimigos dela estão sendo investigados na Operação Lava Jato, que envolve propinas e esquemas de lavagem de dinheiro ligados à empresa estatal petroleira, Petrobrás. Grande parte da população considera que os políticos do país são um bando de ladrões. Com o pano de fundo da instabilidade política e a depauperação crescente, o PT perdeu grande parte da credibilidade que tinha entre as suas bases operárias. Essa revolta foi visível nos protestos de 2013, que foram detonados pelo aumento nas tarifas do transporte e se estenderam, mais tarde, contra o extravagante gasto do governo nos estádios para a Copa, e contra o péssimo estado dos serviços de saúde e ensino e a violência policial. Os partidos opositores de direita aproveitaram esse descontentamento para lançar uma grande campanha contra o PT.

Com as eleições marcadas para o ano seguinte, Rousseff tentou mobilizar seu apoio na base do PT, prometendo melhorar as condições de vida dos operários e dos pobres. Depois de ser reeleita em 2014, com uma margem estreita, abjurou imediatamente das suas promessas, e impôs a austeridade enquanto o país afundava cada vez mais na recessão. Isso serviu para desmobilizar e desmoralizar os trabalhadores e os oprimidos, encorajando ainda mais a direita, incluindo os aliados de bloco do próprio PT. Hoje, os protestos contra o governo, que mobilizam milhões de pessoas, são dirigidos pelas fações políticas reacionárias apoiadas pela oligarquia das mídias e os grupos empresariais pró-americanos.

Rousseff e aqueles que são leais ao PT denunciam os procedimentos do impeachment como um “ato violento” contra a “democracia”, e apresentam esse processo erroneamente como um golpe de estado. Essas afirmações são uma potente estratégia para amedrontar, invocando o medo, em uma sociedade onde ainda está viva a lembrança das feridas causadas pelo sanguinário regime militar iniciado com o golpe de 1964. Muitos trabalhadores, temendo que as forças da direita cheguem ao poder, estão se mobilizando em manifestações contra a revogação do mandato de Rousseff. O PT está usando esses protestos, cheios de bandeiras vermelhas e grande participação de agrupações esquerdistas e sindicais –principalmente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), associada ao PT– com a intenção de canalizar novamente a revolta dos operários para apoiar a frente popular. Enquanto isso, os líderes do PT tentam barrar o impeachment, oferecendo cargos no gabinete aos pequenos partidos burgueses em troca de votos pelo “não” no congresso.

Neste momento, o Brasil não está enfrentando um golpe militar para derrubar o governo, mas uma série de manobras sórdidas no interior do congresso para revogar a presidenta. Ser contra o impeachment de Rousseff significa dar um voto de confiança a frente popular dirigida pelo PT, isto é, apoiá-la politicamente. Favorecer o impeachment significaria apoiar as forças da direita mobilizadas contra Rousseff. Nós, marxistas, somos pela independência política do proletariado e afirmamos que a classe operária não tem lado nesse conflito.

O que a burguesia conseguirá com seus ataques contra os operários irá depender da resistência da luta operária. O proletariado brasileiro é a única força que tem o poder social necessário para dirigir a luta em nome de todos os oprimidos, desde os pobres urbanos das favelas até as mulheres e os camponeses sem terra. Essa perspectiva exige a criação de um partido operário revolucionário que lute por arrancar a base proletária do PT e dos sindicatos das direções atuais como parte da luta pela revolução socialista e o poder operário.

O Grupo Internacionalista: apêndice de esquerda da frente popular

Uma das versões mais combativas do colaboracionismo de classes no Brasil é a proposta pela Liga Quarta-Internacionalista do Brasil (LQB), filiada ao Grupo Internacionalista (GI) dos Estados Unidos. Como a maior parte da esquerda brasileira, eles mantêm a linha do “Não ao impeachment”, que equivale a apoiar politicamente a frente popular de Rousseff (www.internationalist.org, abril de 2016). Mesmo sem usar essa frase, o GI/LQB apresenta outra versão do mesmo bombo publicitário da maior parte da esquerda: a do “golpe judicial”, advertindo que “um estado bonapartista forte, dominado pelos tribunais e pela polícia” i.e., uma ditadura policial-militar– chegaria ao poder se Rousseff fosse afastada do mandato. Para camuflar a sua defesa de um governo burguês, o GI/LQB chama à ocupação de fábricas e à greve geral, reivindicando estar politicamente oposto ao governo.

Na verdade, a posição do GI/LQB não é mais do que uma posição apenas encoberta do oportunismo do “combate contra a direita”. Se eles gritam e esperneiam contra o “bonapartismo”, admitem, ao mesmo tempo, que um golpe de estado no Brasil é improvável, “com o impeachment, a direita teria obtido sua meta prioritária”. Denunciando ritualmente a frente popular e chamando a não votar por ela, o GI/LQB não oferece mais do que justificativas aparentemente marxistas para apoiar a linha da maior parte da esquerda reformista: salvar o governo de Rousseff.

O GI/LQB admite que o PT cometeu ataques contra a classe operária “quais nem mesmo a ditadura militar ousou a fazer”. Ao mesmo tempo, argumenta que um regime dos partidos parlamentares à direita do PT seria qualitativamente mais perigoso que do que a frente popular. Dentro do limite de suas forças, o GI/LQB está ajudando a incentivar a mesma aliança de colaboração de classes que pavimentou o caminho para a reação da direita.

O GI/LQB apregoa que “se ganha a direita bonapartista vão proceder com todo o peso do aparato judiciário-policial.” Como se o governo frente-populista do PT não tivesse mobilizado, uma ou outra vez o “aparato judiciário-policial” contra os operários e os pobres! Falem isso para as massas empobrecidas e predominantemente negras das favelas, que enfrentam todo dia o terror policial. Esse ano ainda, o governo de Rousseff aprovou uma draconiana lei antiterrorista que fortalece o poder repressivo do estado contra os protestos sociais.

O estado burguês –cujo núcleo é formado pelo exército, a polícia, o sistema penitenciário e os tribunais– existe para defender os interesses dos governantes burgueses contra os trabalhadores e os oprimidos. Em 1996, a LQB não teve problemas para convidar o estado capitalista a dirimir disputas sindicais através de uma série de processos judiciais (ver: “El encubrimiento del IG en Brasil: Manos sucias, mentiras cínicas”, em Espartaco n. 10, outono-inverno de 1997).

A história inteira do leninismo e do trotskismo é a história da luta contra a colaboração de classes e pela independência política da classe operária. Foi assim que o Partido Bolchevique conseguiu conduzir os operários da Rússia ao poder em Outubro de 1917. Depois da Revolução de Fevereiro, que derrubou a monarquia czarista, os mencheviques e social-revolucionários entraram num governo de coligação com forças burguesas. Os bolcheviques de V.I. Lenin denunciaram o fato como uma traição ao proletariado e se negaram a dar qualquer apoio ao governo de Alexander Kerensky.

Para dar um brilho de aparência ortodoxa à sua posição contra o impeachment, o GI/LQB invoca, num breve artigo (até agora publicado somente em português), um aspecto da Revolução Russa: a tentativa de golpe de estado que o general Kornilov empreendeu em agosto para derrubar o governo burguês de Kerensky, acabar com os sovietes e esmagar a revolução. Os bolcheviques responderam chamando a formar uma frente unida de todas as organizações operárias para esmagar a ofensiva contrarrevolucionária, lutando militarmente ao lado das tropas de Kerensky, mas sem deixar de fazer oposição ao governo.

O artigo do GI/LQB sobre o golpe de Kornilov reconhece a posição bolchevique, mas, no intuito de justificar a sua própria capitulação ao governo no Brasil, apaga magicamente a clara diferença que existe entre a defesa militar e o apoio político! Seu artigo faz uma relação de várias diferenças entre o Brasil de hoje e a Rússia de agosto de 1917: a Rússia estava em guerra, tinha uma situação revolucionária, tinha sovietes e um partido revolucionário de massas. Mas, desonestamente, omite uma diferença significativa: os operários russos enfrentavam um verdadeiro golpe militar; já os operários brasileiros enfrentam somente as vazias alusões retóricas a um golpe, que têm a intenção de garantir o seu apoio a um governo burguês.

Um ano depois do VII Congresso de 1935, em que a Internacional Comunista estalinizada adotou a política de Frente Popular, o líder bolchevique Leon Trotsky afirmou:

“Desde fevereiro até outubro, os mencheviques e os social-revolucionários, que representam um paralelo excelente dos ‘Comunistas’ e Social-Democratas, mantiveram uma aliança muito estreita e uma coligação permanente com o partido burguês dos cadetes, que juntos formaram uma serie de governos de coligação. Sob o signo dessa Frente Popular agrupava-se o conjunto da massa popular, incluindo os sovietes de operários, camponeses e soldados. É verdade que os bolcheviques participaram nos sovietes. Mas não fizeram nenhuma concessão à Frente Popular. O objetivo deles era romper a Frente Popular, destruir a aliança com os cadetes e instaurar um autêntico governo operário e camponês”.

—Leon Trotsky, “A secção holandesa e a Internacional” julho de 1936

Para os marxistas, a diferença entre defesa militar e apoio político é de vital importância. Durante a Guerra Civil Espanhola (1936-39), a frente popular colaborou com a repressão da revolução operária, pavimentando o caminho para a vitória das forças do general Francisco Franco. Naquela época, os trotskistas deram seu apoio militar à parte republicana, contra o Franco e os fascistas espanhóis. Em 1937, Max Shachtman, um dos dirigentes do Socialist Workers Party dos Estados Unidos, defendeu os créditos de guerra para o governo da frente popular sob o primeiro ministro socialista Juan Negrín. Shachtman perguntou: “Como poderíamos nos opor à concessão de um milhão de pesetas para comprar fuzis para a frente?” Numa carta de 1937, Trotsky insistiu em que a única política correta seria um “voto negativo” sobre o orçamento militar. Segundo explicou:

“Um voto no parlamento pelo orçamento financeiro não é uma simples ‘ajuda material’, mas um ato de solidariedade política...

“Tudo aquilo que o governo de Negrín faz, é feito sob a bandeira de necessidades da guerra. Se aceitarmos a responsabilidade política pela sua administração das necessidades da guerra, votaríamos politicamente por cada proposta séria do governo... Nessas condições, como poderíamos preparar-nos para derrubar o governo de Negrín?"

—“Carta a James P. Cannon” (21 de setembro de 1937)

Ao se opor ao impeachment, o GI soterra a linha de classes, aceitando os moldes dos reformistas –“o progressista vs. o reacionário”–, que já foram usados repetidamente para alegar que a oposição dos marxistas aos governos burgueses de esquerda favorece a direita. Essa acusação foi levantada num caso clássico de oposição à frente popular. Em 1964, o então líder trotskista Edmund Samarakkody e um dos seus camaradas votaram no parlamento pela emenda proposta por um político de direita que levou à queda de um governo de frente popular em Ceilão (hoje Sri Lanka). Essa ação principista e corajosa foi discutida na I Conferência Internacional da tendência espartaquista internacional em 1979. Nessa época o Samarakkody já tinha repudiado, incorretamente, seu voto de 1964. Nossos camaradas defenderam o seu voto em 1964; uma melhor opção teria sido que Samarakkody denunciasse o procedimento parlamentário e abandonasse o parlamento. Em 1979, contra a retratação de Samarakkody, o atual líder do GI, Jan Norden, que naquele momento era um quadro da nossa tendência, afirmou corretamente o seguinte:

“Outra objeção comum à nossa política de oposição proletária à frente popular é a acusação de que ela ajuda a direita. Mas, até estar preparado para derrubar o governo existente, toda oposição a uma frente popular no governo poderá ser acusada de ajudar a direita”.

—Spartacist (edição em inglês), n. 27-28, inverno de 1979-1980

Mas essa era outra época. Desde que levou um pequeno grupo de seguidores a sair da nossa organização, duas décadas atrás, Norden direcionou-se cada vez mais para a direita, escondendo o seu rasto com uma retórica pseudocombativa.

A classe operária não tem interesses em comum com os opressores e exploradores capitalistas. Durante a fase recente de governos burgueses de esquerda na América Latina –sejam eles frente populistas, como o do Brasil, ou populistas, como o da Venezuela e outros lugares–, somente a LCI levou ao proletariado este raciocínio de uma maneira consistente. Os mais de treze anos de governo do PT são um exemplo gráfico da lição que Marx tirou da experiência da Comuna de Paris de 1871: O proletariado não pode tomar as rédeas do estado capitalista para seus próprios interesses; deve esmagá-lo com uma revolução socialista que estabelecerá um estado operário em seu lugar.

Desencadear o potencial revolucionário do proletariado brasileiro exige forjar um partido revolucionário internacionalista, baseado na perspectiva da revolução socialista por todas as Américas e internacionalmente, especialmente no coração do imperialismo: os Estados Unidos. Somente a revolução socialista internacional, criando as bases para uma planificação socialista internacional, poderá garantir um desenvolvimento econômico qualitativo para os países que hoje estão sob a bota do imperialismo. A LCI luta para reforjar a Quarta Internacional de Trotsky como o instrumento necessário para levar a consciência comunista ao proletariado e para conduzi-lo ao poder à frente de todos os oprimidos.